terça-feira, 16 de agosto de 2011

16 de agosto - São Roque (taumaturgo e peregrino)

São Roque em glória
Giuseppe Angeli - Scuola Grande di San Rocco, Veneza

Muitos santos medievais, pertencentes à nobreza, renunciam inteiramente a sua condição social - e este é bem o caso de São Roque - para praticarem a perfeição da virtude cristã no despojamento completo dos bens deste mundo. E isto o Santo realizou como peregrino, que faz lembrar o Bom Samaritano, socorrendo as vítimas da peste negra que então grassava em várias regiões da Itália e também da França, sua terra natal. Pode-se dizer que, à época de São Roque (1295-1327), o mundo cristão vivia uma situação duplamente pestilencial: no sentido espiritual, e também no material.
Pesava sobre a Igreja Católica a luta entre o Papado, o Império e o Reino da França. As divisões daí decorrentes influenciaram o Sacro Colégio dos Caldeais. Em conseqüência, os Papas deixaram a Cidade Eterna e se estabeleceram em Avinhão (sudeste da França, próximo de Montpellier, cidade natal de São Roque).
Em 1304, morria o bem-aventurado Bento XI, e no ano seguinte, num conclave trabalhoso foi eleito na França, como Papa, o Arcebispo de Bordéus, Dom Bertrand de Got, com o nome de Clemente V (1305 a 1314). O novo Papa estabeleceu-se em Avinhão, onde levantou palácios, corte e fortalezas. Durante 70 anos os Papas ali residiram.
Entre os católicos, as heresias faziam suas vítimas, afastando o povo da verdadeira doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo: valdenses, cátaros e albigenses, patarinos, os beguardos.
E, para acréscimo de sofrimento, a peste negra afugentava as populações das cidades e dizimava com morte dolorosa.
Guido Reni - 1617
Galeria Estense - Módena

São Roque nasceu em 1295 no sudeste da França, em Montpellier, cidade rica de história religiosa, cultural e artística. Sua família, profundamente católica, pertencia à nobreza e fazia parte do governo da cidade. O pai chamava-se João Rog (de onde vem o nome Roque) e a mãe, Líbera.
O Santo, com toda certeza, cursou as escolas de sua cidade, especialmente a célebre Faculdade de Medicina. E este estudo não foi inútil para seu futuro aposto lado entre os doentes e empestados, em favor dos quais operou incontáveis milagres. Ele ficou órfão ainda jovem, e quando atingiu os 20 anos de idade, devia assumir a direção do palácio familiar e a administração de vastas terras. Lembrou-se da passagem do Evangelho sobre o moço rico, e do apelo que fizera Nosso Senhor quando lhe respondeu como deveria fazer para ser perfeito. Então, Rogue renunciou à sua nobreza e distribuiu aos pobres o seu rico patrimônio. Saiu ocultamente de sua cidade, dirigindo-se, como peregrino, a Roma, onde haveria de permanecer três anos, e à Terra Santa, em peregrinação penitencial.
São Roque entre as vítimas da peste
Tintoretto - 1594
Scuola Grande di San Rocco- Venezia

Seu percurso, entretanto, foi enormemente tumultuado, pois teve de interrompê-lo repetidas vezes para socorrer os acometidos pela peste negra em torno de Roma e em diversas localidades da Província da Romanha (Cesena, Rimini e Forli).
Na própria Cidade Eterna, quando ali chegou, São Roque encontrou o povo da cidade sobressaltado por causa da peste, que ali grassava.
São Roque entre os pestilentos
Jacoppo Bassano - 1575
Pinacoteca de Brera, Milão

Ao passar por Piacenza cuidando dos enfermos, também ele contraiu a peste negra. Para não molestar ninguém e poder tratar-se por si próprio, retirou-se para um bosque, habitando uma cabana situada à beira de uma nascente. Curado milagrosamente por um anjo, passou a ser alimentado por um cachorro que todos os dias lhe trazia um pedaço de pão.
Assim, durante oito anos, a Itália tornou-se sua pátria de adoção, como santo protetor contra as epidemias. Ele chegou à sua cidade natal em trajes de peregrino, sem revelar sua identidade, e foi tomado por vagabundo e espião, pois Montpellier vivia momentos de grande agitação política. Por ordem do próprio tio, Bartolomeu Rog, foi encarcerado, sofrendo durante cinco anos os vexames da prisão, sua solidão e incômodos. E morreu no cárcere, no dia 16 de agosto de 1327, com 32 anos de idade. Só então é que se soube quem era ele, pois deixara sob sua cabeça uma tabuinha com o seu nome escrito.
Giovanni Battista Pittoni
Museu de Belas Artes de Budapest

A notícia despertou entre os habitantes da cidade uma emoção profunda. Clero, nobreza e povo, também das cidades vizinhas, acorreram para venerar seus despojos expostos à visitação pública, primeiro no palácio da família, e depois na igreja de Nossa Senhora des Tables. Para reparar a injustiça, seu tio Bartolomeu mandou erigir, na cidade vizinha de Miguelone, artístico mausoléu em forma de capela. E o povo proclamou-o Santo Padroeiro contra epidemias e doenças graves.
Lorenzo Lotto, séc. XVI
col. particular

Em 1485, a maior parte de suas veneráveis relíquias foram transferidas para Veneza, guardadas pela Irmandade, instituída sob seu patrocínio. A Sereníssima República, rainha dos mares, haveria de ser o foco de irradiação da devoção e de seu culto para o mundo inteiro.
Escola francesa do séc. XVI

Iconografia

Seus atributos inconfundíveis são:
-  o cão, sinal tangível da Divina Providência que o socorria nos momentos de necessidade, símbolo da sua fidelidade ao chamado divino;
- a concha, que recorda a sua peregrinação a Santiago de Compostela, símbolo da perseverança;
- a chaga, símbolo da peste que contraiu perto de Piacenza ao dedicar-se a cuidar dos doentes, símbolo da caridade cristã;
- o anjo (fig.2), símbolo da ligação com o Divino, e que infunde coragem especialmente nos momentos de solidão e sofrimento;
- o bastão como símbolo da peregrinação terrena e daquela em direção ao caminho divino (fig.6)
- a cruz vermelha recordando o sinal que ele tinha no peito desde seu nascimento, símbolo do seu apostolado da caridade;
- o pão, símbolo da Eucaristia, aquele mesmo pão que o cão lhe trazia, em Piacenza, roubando-o da mesa de seu patrão (fig.5)

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